CHEMISTRY



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CHEMISTRY

Signals transmitted
Message received
Reaction making impact -
Invisibly

Elemental telepathy
Exchange of energy
Reaction making contact -
Mysteriously

Eye to I
Reaction burning hotter
Two to one
Reflection on the water
H to O
No flow without the other
Oh but how
Do they make contact
With one another?

Electricity? Biology?
Seems to me it's Chemistry

Emotion transmitted
Emotion received
Music in the abstract -
Positively

Elemental empathy
A change of synergy
Music making contact -
Naturally

One, two, three -
Add without subtraction
Sound on sound
Multiplied reaction
H to O
No flow without the other
Oh but how
Do we make contact
With one another?
QUÍMICA

Sinais transmitidos
Mensagem recebida
Reação causando impacto -
Invisivelmente

Telepatia elemental
Troca de energia
Reação fazendo contato -
Misteriosamente

Olho no olho*
Reação arde mais quente
Dois a um
Reflexo na água
H para O**
Um não flui sem o outro
Oh mas como
Eles fazem contato
Um com o outro?

Eletricidade? Biologia?
Me parece Química

Emoção transmitida
Emoção recebida
Musica no abstrato -
Positivamente

Empatia elementar
Uma troca de sinergia
Música fazendo contato -
Naturalmente

Um, dois, três -
Some sem subtrair
Som sobre som
Reação multiplicada
H para O**
Um não flui sem o outro
Oh mas como
Fazemos contato
Um com o outro?

* Trocadilho com 'Eye to Eye' (Olho por Olho - o contato pessoal direto), devido à fonética idêntica com 'Eye to I' (algo próximo a 'olho em mim', que exemplifica uma forte identificação).
** Trocadilho com a fórmula molecular da água - H2O , devido à fonética idêntica com 'H to O' (H para O), que exemplifica a atração das moléculas de hidrogênio pela de oxigênio.



Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart


A maravilhosa e intrigante dinâmica das ligações emocionais

"Chemistry", a terceira canção de Signals, teve sua letra e música escritas pelos três integrantes do Rush, fato bastante incomum na carreira da banda. Normalmente, Neil Peart é creditado como o único compositor das letras, e Geddy Lee e Alex Lifeson são os responsáveis diretos pela criação musical. Porém, nessa faixa, todos se envolveram nas duas atividades.

"Chemistry foi uma verdadeira colaboração entre nós três", explica Lifeson. "Os outros caras tinham algumas frases-chave na cabeça que queriam expressar, e me entregaram as mesmas para a música. Foi fácil jogar tudo numa base que já estava feita. Brincar com palavras se torna muito mais fácil do que ter que inventar a coisa toda".

Signals
começou a ser escrito em 1981, durante as passagens de som da Moving Pictures Tour - estas que seguiam sendo gravadas. Coincidentemente, partes de "Chemistry" foram escritas pela banda de maneira simultânea, enquanto os três estavam separados. Geddy compôs as melodias de teclado, Alex preparou o riff de guitarra nos versos e Neil compôs a bateria para o refrão. Em um movimento raro para o Rush, Lee e Lifeson vieram com o conceito e título, apresentando para Peart a letra a ser lapidada - fato que, por si só, caracteriza a perfeita química da banda. O baterista detalha o processo de concepção:

Por volta das 4:15 da manhã, fizemos nosso caminho de volta para o ônibus. Kevin havia feito nosso check out no hotel e arrumado nossas bagagens, e naquela noite estaríamos indo para 'Algum Lugar nos EUA'. Whitey colocou o ônibus em movimento, partindo em direção ao local que tocaríamos.

Em 'tempos de estrada', essa é a primeira coisa a se fazer pela manhã, e não havia muito a dizer além do 'bom dia' superficial. Geddy sussurrava o jornal local, conferindo os últimos placares do beisebol, Alex folheava de forma desinteressada uma revista de aviões Plane and Pilot que já havia lido umas doze vezes e eu fumava um cigarro quase dormindo. Cortinas fechadas para o mundo, estávamos afastados do público.

No palco, começamos a checar os instrumentos separadamente; boom-boom-boom, tap-tap-tap, thud-thud-thud, strum-strum-strum, woof-woof-woof, test-test-test etc., nos movendo gradualmente para uma criação espontânea. Foi a primeira vez em turnê que nosso técnico de som, Jon, gravou as passagens, algo que se revelava muito proveitoso para nós. Nesse dia particular em 'Algum Lugar nos EUA', fomos indo sem saber que estávamos compondo uma música inteira de uma só vez, com cada um de nós fazendo uma parte diferente. Enquanto Geddy tocava o que se tornaria a melodia de teclado na parte da ponte, Alex fazia os riffs de guitarra dos versos e eu a percussão dos refrões, só isso!

Quando Alex e Geddy se reuniram para peneirar as fitas das passagens de som, eles acabaram encontrando uma música inteira composta, partindo para organizá-la - fazendo uma demo que estava bem perto de uma canção terminada.

Essa foi a primeira vez que nós três colaboramos na letra de uma canção. Geddy e Alex surgiram com o título e conceito para a música, escrevendo algumas frases-chave e palavras que eles queriam que entrassem. Passaram-me tudo em seguida, para uma organização e desenvolvimento que fossem um pouco mais longe. Quando tudo isso foi colocado em conjunto, tivemos o que foi provavelmente a canção mais fácil de se compor em todo o álbum. Mais uma vez, surge nosso departamento 'Pesquisa e Desenvolvimento' das passagens de som.


Em termos musicais, "Chemistry" fixa ainda mais o Rush em seu novo direcionamento, dando sequência às propostas musicais apresentadas com as primeiras canções, "Subdivisions" e "The Analog Kid". A banda mantém seu afastamento dos moldes clássicos progressivos que os consagraram na década anterior, se dedicando agora, de forma clara e crucial, ao formato mais acessível e conciso de suas canções. É interessante observar, mais uma vez, a grande ousadia dos canadenses, que vinham de um inegável êxito mundial com o anterior Moving Pictures, decidindo em Signals mudar sua fórmula mais uma vez, acreditando em seus instintos e em sua ampla visão de futuro.

"Chemistry" segue em tomadas moderadas 4/4, mas com várias mudanças de texturas. A maioria das seções utilizam sintetizadores polifônicos, bateria ativa, gestos de guitarra ocasionais e circulares e pedais Moog Taurus muitas vezes substituindo linhas de baixo.

"Podíamos ter feito Moving Pictures novamente, mas estávamos tão curiosos, tão insatisfeitos com nossa situação e, por termos sido bem-sucedidos, não queríamos dizer que teríamos que parar", explica Geddy. "Essa é a motivação. Temos que encontrar o melhor do Rush".

A presença dos sintetizadores e a influência da new wave são amplas em "Chemistry". Mesmo assim, a composição acaba rendendo um solo incrivelmente intenso de Lifeson. A atmosfera futurista tomava grande importância neste trabalho, algo que seria marcante nas produções do trio ao longo dos próximos anos.

"Sintetizadores e tecnologia surgiram como uma forma de estimular nossa criatividade", afirma Geddy. "Minha necessidade de conceber a melodia fica mais satisfeita com a composição em um teclado. Como compositor, você está sempre procurando um ângulo que lhe dê algo novo".

"Havia uma grande mudança acontecendo em Signals"
, diz o produtor de longa data, Terry Brown. "Os teclados estavam se tornando cada vez mais importantes do ponto de vista do Geddy. Aquilo não me atraía. Eu ainda queria o elemento da base acústica - não queria uma banda eletrônica".

"Adoramos a música dessa época"
, afirma Peart. "Somos jovens o suficiente e não nos sentimos protetores daquilo que o Rush foi para não sermos influenciados pela new wave. Não há algo como 'Isso não combina com o Rush' - essas palavras nunca foram ditas".

Novamente tratando no álbum das relações interpessoais, "Chemistry" traz algumas definições inerentes à química. Aludindo ao mundo subatômico, os integrantes observam com perspicácia o fluxo das reações químicas e até mesmo dos hormônios, tentando descrever com a canção a incrível capacidade que os seres humanos têm de se relacionar além do uso da linguagem falada. Tomando algumas palavras-chave como "sinais", "energia", "reação", "telepatia" e "sinergia", "Chemistry" evoca a linguagem corporal, o contato visual e a ligação simbiótica entre duas pessoas, abordando também a fantástica conexão e afinidade entre os três músicos.

"Bem, me foi dada a palavra 'Sinais'", lembra o artista gráfico Hugh Syme. "Era um conceito tão amplo que foi desconcertante para todos nós. Realmente tivemos problemas com ele e decidi que, com uma palavra tão incrivelmente importante e com seu poder em potencial, viria com algo bem estúpido, bem fútil, mas que combinaria com canções como 'Chemistry' e com o aspecto da subdivisão dos bairros com hidrantes, gramados e cães de estimação".

A letra de "Chemistry" visita o magnífico fenômeno dos vínculos emocionais, um sincronismo natural e intrigante que revela conexões incrivelmente fortes, porém muito difíceis de serem plenamente compreendidas. Podemos pensar em pessoas vigorosamente ligadas pelo amor ou pela amizade, estabelecendo elos invisíveis que são capazes de distinguir e assimilar reações do outro através de pequenos sinais ou atitudes, tudo isso pelo fato de se conhecerem profundamente. Tais conexões funcionam como se não precisássemos de palavras para nos comunicar, apenas de sinais (sentimentos / emoções) para transmitir e receber. Mais uma vez, um belíssimo trabalho em letras da banda.

"'Two to one, reflections on the water' é uma referência a dois amantes… é sobre o amor", afirma Neil. "A segunda parte é sobre nós três. É muito simples".

O primeiro trecho descreve de forma singular a natureza de uma ligação amorosa entre duas pessoas. Com uma abordagem muito similar àquela utilizada em "Vital Signs", composição que fecha Moving Pictures, o trio decide explorar a natureza do amor de maneira quase disfarçada, oferecendo o tema em uma composição altamente cerebral - uma tomada científica e ao mesmo tempo poética. A proximidade e a intimidade podem se fortificar de tal forma que nos tornamos capazes de perceber o que o outro está pensando ou sentindo, através de uma mínima e fugaz expressão facial por exemplo.

O belo refrão de "Chemistry" intensifica a inspiração e traz ainda alguns trocadilhos fonéticos muito interessantes. Sem a chamada química do sentimento entre as pessoas, as conexões abordadas pela banda na música simplesmente não fluirão. Geddy, Alex e Neil utilizam algumas das características e atribuições da química (e de algumas de suas ramificações, como a bioquímica e a neuroquímica) como as metáforas principais do tema, pois, apesar do assunto abordado não ser totalmente compreendido pela ciência, conseguimos sentir perfeitamente quando o fenômeno acontece em nossas mentes. A química é considerada, assim como a física e a matemática, uma ciência exata, estudando a estrutura, a composição e a transformação das diversas matérias existentes e as inúmeras substâncias que as formam, observando também os processos químicos que ocorrem nos organismos vivos - no cérebro e no sistema nervoso de um modo geral. Podemos perceber em "Chemistry" menções às sinapses, às trocas de energia exotérmicas ou endotérmicas para que ocorram as reações - liberações em forma de calor ou com a absorção de calor do ambiente - e a alusão à água, o solvente universal.

Algumas palavras-chave refletem muito bem as intenções da segunda parte, esta que destrincha a essência da incrível relação entre os próprios integrantes do Rush - ou a "química" entre eles. Sinergia significa cooperação, trabalho ou esforço para realizar uma determinada tarefa muito complexa, na tentativa de se atingir êxito no final. Empatia indica a capacidade psicológica para sentir o que sentiria outra pessoa, caso estivesse na mesma situação vivenciada por ela, consistindo em tentar compreender sentimentos e emoções procurando experimentar, de forma objetiva e racional, o que sente o outro indivíduo. Já o trocadilho com a fórmula química da água (H2O), que aqui aparece como "H to O" (Ou H para O), reflete que a dinâmica da polarização dessas moléculas. O oxigênio atrai as moléculas de hidrogênio por apresentar maior eletronegatividade, ou seja, ele é mais ávido pelos elétrons.

Com tantas informações incríveis, o que fica claro no teor de "Chemistry" é que essa intrigante e fantástica dinâmica química ocorre de fato em nossos corpos, mas ela sempre irá necessitar de um outro ser humano para que seja despertada, transmitida e captada. A interação e entrosamento do próprio Rush refletem o resultado.

© 2015 Rush Fã-Clube Brasil

BERTI, J. BOWMAN, D. "Rush and Philosophy: Heart and Mind United (Popular Culture and Philosophy)". Open Court. May 10, 2011.
PRICE, Carol S. "Mystic Rhythms: The Philosophical Vision of Rush". Borgo Press. December 1, 1999.
NAYLOR, Sean D. "Feedback! Rock Interviews, Issue Nº 1". July 1983.
Agradecimentos especiais a cooperação dos fãs Lucas Pinho (Químico) e Filipe Oliveira (Engenheiro Químico).