GHOST OF A CHANCE



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HERESY  GHOST OF A CHANCE  NEUROTICA


GHOST OF A CHANCE

Like a million little doorways
All the choices we made
All the stages we passed through
All the roles we played

For so many different directions
Our separate paths might have turned
With every door that we opened
Every bridge that we burned

Somehow we find each other
Through all that masquerade
Somehow we found each other
Somehow we have stayed
In a state of grace


I DON'T BELIEVE IN DESTINY
OR THE GUIDING HAND OF FATE
I DON'T BELIEVE IN FOREVER
OR LOVE AS A MYSTICAL STATE
I DON'T BELIEVE IN THE STARS OR THE PLANETS
OR ANGELS WATCHING FROM ABOVE
BUT I BELIEVE THERE'S
A GHOST OF A CHANCE
WE CAN FIND SOMEONE TO LOVE
AND MAKE IT LAST

Like a million little crossroads
Through the backstreets of youth
Each time we turn a new corner
A tiny moment of truth

So many different connections
Our separate paths might have made
With every door that we opened
Every game we played

Somehow we find each other
Through all that masquerade
Somehow we found each other
Somehow we have stayed
In a state of grace
PEQUENA POSSIBILIDADE

Como um milhão de pequenas entradas
São todas as escolhas que fizemos
Todos os palcos pelos quais passamos
E todos os papéis que interpretamos

Por tantas direções diferentes
Nossos caminhos separados poderiam ter se cruzado
Com cada porta que abrimos
E cada laço que cortamos

De alguma forma nos encontramos
Nesse grande baile de máscaras
De alguma forma nos encontramos
E de alguma forma permanecemos
Em estado de graça

NÃO ACREDITO EM DESTINO
OU NA MÃO CONDUTORA DA SORTE
NÃO ACREDITO NO PARA SEMPRE
OU NO AMOR COMO UM ESTADO MÍSTICO
NÃO ACREDITO NAS ESTRELAS OU PLANETAS
OU NOS ANJOS VIGIANDO LÁ DE CIMA
MAS ACREDITO QUE EXISTA
UMA PEQUENA POSSIBILIDADE
DE ENCONTRARMOS ALGUÉM PARA AMAR
E FAZER DURAR

Como um milhão de pequenas encruzilhadas
Pelas ruelas da juventude
Cada vez que dobramos uma nova esquina
Um pequenino momento de verdade

Tantas conexões diferentes
Que nossos caminhos poderiam ter sido separados
Com cada porta que abrimos
E cada jogo que jogamos

De alguma forma nos encontramos
Nesse grande baile de máscaras
De alguma forma nos encontramos
E de alguma forma permanecemos
Em estado de graça


Música por Geddy Lee e Alex Lifeson / Letra por Neil Peart


A aleatoriedade que pode render um amor duradouro

"Ghost of a Chance" é a oitava canção de Roll The Bones, uma composição muito cativante que pode ser definida como um marco na vasta carreira do Rush. Essa é, de fato, a primeira composição de Neil Peart que traz o amor como tema central, assunto jamais abordado de forma tão direta em suas músicas. A faixa representa, sem dúvidas, um dos mais interessantes e elegantes esforços produzidos para o disco, continuando a perseguir ideias que reafirmam a compreensão da total imprevisibilidade e aleatoriedade da vida.

Com o entrelaçar de guitarras atmosféricas sempre brilhantes e vigorosas, linhas de baixo muito acuradas, bateria robusta e belíssimas performances vocais mesclando leveza e contundência, "Ghost of a Chance" prova que o Rush poderia produzir uma canção de ares românticos sem titubear seu estilo musical. Aqui, Peart escapa com eficiência de todos os clichês que geralmente acompanham esse tipo de tema, conseguindo transmitir suas intenções com a utilização de alternativas que defendem a obra como uma investida concernente e original.

"Ghost of a Chance" traz um harmonioso composto melódico conduzido principalmente pelo sublime trabalho realizado por Alex Lifeson, talvez o ponto chave que a define como uma brilhante balada rock. Conforme a segunda faixa "Bravado", o solo que "Ghost of a Chance" foi surpreendentemente conseguido em um único take, quando o guitarrista preenchia sem compromisso o espaço em branco na fita demo da música, esperando que este nascesse de fato posteriormente.

"'Bravado' e 'Ghost of a Chance' trazem dois solos que sinto que estão, provavelmente, entre os melhores que já fiz", afirma Lifeson. "São muito emotivos e espontâneos, conseguidos em um único take. Nos acostumamos a ouvi-los e percebemos que se encaixavam perfeitamente nas músicas, com o baixo e a bateria se ajustando ao que faziam e não havendo, assim, nenhum motivo real para voltarmos a gravá-los. 'Ghost of a Chance' foi bem surpreendente - parecia ser a canção mais fraca no começo, mas que foi desenvolvida se tornando a favorita de todos. O solo veio originalmente da fita demo, feito apenas para preencher o espaço. Soou com grande espontaneidade e emoção".

"Só toquei aquilo para preencher o espaço na seção que ficou separada para o solo. Era a última coisa que tinha para fazer naquele dia. Já era muito tarde, estávamos muito cansados e as luzes já estavam quase todas apagadas. E tudo funcionou, tudo se encaixou. Neil pegou algumas das minhas tercinas e baseou seu padrão de bateria para a música inteira, tudo a partir do meu solo na demo. Sua composição me deixou boquiaberto".

"O solo ficou pronto no primeiro take, e ele era apenas para preencher o espaço da pequena fita na qual eu e Geddy trabalhamos. Quando Neil começou a tocar para a faixa, pegou ritmos desse solo e baseou alguns dos padrões de bateria nele. O solo da demo cresceu verdadeiramente em nós e, quando chegamos no momento de prepararmos os definitivos - após todas as faixas-base e guitarras rítmicas - percebemos que esse tinha exatamente a emoção e sensação que queríamos. Dessa forma, o deixamos da forma que estava".

"No momento em que partimos para definir o solo, quis fazer esse da demo novamente, mas não consegui. Não fui capaz de recuperar aquela qualidade de som. É praticamente impossível duplicar um momento não planejado, quando tudo acaba nascendo junto. Por fim, utilizamos o primeiro mesmo, com todos aqueles elementos que trazem uma sensação muito distinta. Adorei aquele solo".

"Realmente, utilizamos alguns dos materiais que havíamos gravado em fitas demo. Mantive três solos, 'Bravado', 'Roll The Bones' e 'Ghost Of A Chance', que foram solos de, praticamente, um único take. Normalmente, gosto de trabalhá-los durante o desenvolvimento das outras partes de guitarra, enquanto as faixas básicas estão sendo feitas - nos velhos tempos, eu costumava ter algumas semanas para fazer isso. Dessa vez, todas as faixas fundamentais foram feitas em cinco dias, e tive que apertar o passo. Mesmo assim, tinha uma ideia bem clara do que eu queria fazer, não me prolongando. No fim das contas foi bom, pois não fiquei tão preso a cada canção, o que trouxe essa sensação de espontaneidade - porém com foco e uma direção clara. Às vezes, pode ser benéfico ter pressão sobre você".

"Temos guitarras maravilhosas aqui"
, diz Peart. "É o tipo de canção que sempre achamos que tinha tudo para ser um hit nas rádios, mas que não foi. Tudo isso porque somos muito estranhos".

Lee concorda que "Ghost of a Chance" é bastante cativante. "É uma das minhas canções favoritas do disco na guitarra", ele diz. "Aquele solo é um dos melhores que o Alex já fez. É muito expressivo".

Seguindo as ideias que definem Roll The Bones, "Ghost of a Chance" expressa mais uma vez ponderações sobre a inconstância e a imprevisibilidade da vida. Nessa canção, Neil Peart aborda as diminutas, porém ainda assim otimistas chances que temos de encontrar uma pessoa ideal em nossa realidade louca, variada e caótica. Nessa linha, o letrista também lança críticas sobre crenças em forças místicas ou divinas agindo nesses encontros, avançando com a noção de que a vida é apenas um exercício de sorte ou azar. Assim, Peart encara em "Ghost of a Chance" o grande desafio de compor sobre o amor sob a ótica do Rush, superando-o na qualidade sempre marcante de suas reflexões.

"Sempre me esquivei das canções de amor, e até mesmo de mencionar a palavra por ser muito cliché, até perceber que havia encontrado uma nova forma de abordagem, uma nova nuance para me expressar. Não escreveria apenas mais uma música desse tipo".

"Até esse álbum, me sentia desconfortável em escrever letras sobre emoções e amor. Parte da razão era a de evitar todos os clichês. O amor esteve na lista dos assuntos proibidos por aproximadamente cinco anos, apesar de tê-lo abordado de certa forma na canção 'Open Secrets' (do álbum Hold Your Fire, de 1987), esta que não tratava de um relacionamento amoroso, mas sim de uma relação qualquer entre duas pessoas. A primeira canção sobre a qual decididamente senti que havia dominado a técnica foi 'Ghost of a Chance', tentando comunicar sobre como duas pessoas podem dividir um quarto, mas a mundos de distância".

"'Ghost of a Chance' se encaixou bem com meu tema geral da aleatoriedade e da contingência, mas, ao mesmo tempo, era uma chance que eu tinha de escrever sobre o amor de uma maneira diferente, dizendo, 'Aqui estão todas as coisas pelas quais passamos na vida e as pessoas que encontramos - tudo sendo fruto do acaso'. As esquinas que viramos, os lugares para os quais vamos e as pessoas que encontramos - todas essas coisas são tão aleatórias e, apesar de tudo, pessoas se encontram. Se trabalharem juntas, poderão fazer seus encontros durarem. Dessa forma, estou dizendo que há uma pequena possibilidade disso acontecer, mesmo com chances muito pequenas. E, ao mesmo tempo, essa pequena possibilidade acaba levando pessoas a se encontrarem, e a ficarem juntas".


Novamente, Peart nega fatalismos e determinismos em "Ghost of a Chance", reafirmando que o mundo e a realidade são de fato uma teia de acasos, felizes e infelizes. O letrista recusa a vaga frase "tudo acontece por uma razão", defendendo os acontecimentos como frutos da boa ou da má sorte, que não trazem em si causas ou explicação. Nossa existência, portanto, mostra-se como um verdadeiro emaranhado de acidentes, sendo totalmente indeterminada. Assim, a contingência afirma que a realidade é, definitivamente, inesperada e mutável.

"'Ghost of a Chance' desmascara várias canções sentimentais que dizem que um amor à primeira vista não vive para sempre, ou que o amor é preparado no céu e tudo o mais. Pessoas se encontram por acidente, e a parte fácil é se sentirem atraídos um pelo outro - o difícil é fazer durar. De alguma forma, acabamos encontrando alguém entre todos esses mascarados, sendo essa uma busca atemporal. Sabemos que as possibilidades não são boas, mas a maioria de nós continua tentando. Alguns têm sorte, e outros não. É a vida".

Peart sempre foi muito elogiado pelas frases bem arquitetadas e perspicácia em suas letras. Sobre seu segredo, ele menciona como principal elemento a disciplina, sem hesitação. "As pessoas pensam que compor é sempre proveniente de uma inspiração misteriosa, mas, na verdade, é simplesmente estar à beira do sono e ter uma ideia que te obriga levantar para escrever. Ou, até mesmo enquanto você trabalha em alguma coisa e uma frase surge na sua cabeça - daí você a escreve e ela fica lá, parada por mais de um ano para quando você precisar. Em um processo de composição, você tem que seguir capturando todas as suas pequenas inspirações para depois sentar-se com elas durante uns três dias se for preciso, buscando uma direção".

A consciência existencial de Peart se resume perfeitamente em "Ghost of a Chance", e com uma reviravolta relativamente surpreendente. Após recusar o destino, o fatalismo e os "anjos vigiando lá de cima", ele afirma ainda assim ser possível "encontrar alguém para amar". Dessa forma, perseguir valores humanos é algo que ainda vale a pena para o letrista, sendo para ele um dos pilares para o alcance da felicidade em um mundo tão absurdo.

"Pensei nesse assunto baseado no tema geral 'acaso' - as possibilidades nos relacionamentos, e em como é raro encontrar alguém com a química, para começar. Também escolhi as palavras cuidadosamente, dizendo "find someone to love and make it last" ["encontrarmos alguém para amar e fazer durar"], pois acho realmente que fazer durar é um ato de vontade e disciplina, precisando mais do que a primeira carga elétrica hormonal".

"O pensamento dessa canção foi muito mais universal do que apenas algo sobre mim, pois, como princípio básico, não gosto mesmo de canções sobre auto revelações ou de pessoas que escrevem álbuns inteiros sobre seus divórcios e coisas do tipo".

"Assim, meu ideal é sempre encontrar um ponto dos meus sentimentos pessoais para tentar torná-los universais, seja a raiva, o amor, a felicidade ou a inspiração. Quero pegar coisas minhas buscando encontrar uma metáfora ou um conjunto de imagens que permitirão com que outras pessoas reflitam sobre suas próprias experiências".


"Ghost of a Chance", portanto, é mais um brinde à aleatoriedade da vida, cuja assimilação e compreensão devem ser a fonte de energia para que tenhamos uma jornada ampla e plena. É necessário estar atento a todos os pequenos detalhes, movimentos e acontecimentos, pois seus desdobramentos podem nos reservar surpresas que mudarão totalmente o nosso humor - e até mesmo o nosso curso.

"Bem, é tão simples quanto compartilhar um sorriso com alguém na rua, ou acenar para uma criança. Quando estou andando de bicicleta pela cidade ou dirigindo na estrada, as crianças acenam pra você da parte de trás de um carro, ou algo do tipo [risos]. Esses são pequenos grandes momentos que podem colocar um sorriso no seu rosto".

"E claro, o 'tipo duradouro' refere-se a relacionamentos nos quais você tem que seguir trabalhando ao longo do tempo, sejam pessoais ou profissionais. Eles requerem muito trabalho e esforço, precisando de manutenção. Tentei deixar isso claro em 'Ghost of a Chance', com as palavras sendo escolhidas com bastante cuidado. Assim, falo sobre esses relacionamentos duradouros, como casamentos e fortes amizades".


© 2015 Rush Fã-Clube Brasil

KEDDIE, G. "Rush Hour: Geddy Lee & Alex Lifeson". Guitarist. May 1992.
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WIDDERS-ELLIS, A. "Rush Redefined". Guitar Player. November 1991.
COBURN, B. "Neil Peart On Rockline For Roll The Bones". Rockline. December 2, 1991.
MIERS, J. "The Road Less Traveled / A Conversation With Neil Peart Of Rush". Weekend Music Editor - Buffalo New York's Metro Weekend. October 17 - 23, 1996.
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