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GUIA OFICIAL E MANUAL DO USUÁRIO

por Neil Peart

OLÁ-Á-Á-Á!

Tem alguém aí?

O título é sobre isso. Todo mundo precisa de um “eco”, todos precisam de alguma afirmação para saber que não estão sozinhos. Às vezes esse ato na vida pode ser uma das descobertas mais preciosas – alguém lá fora que conheça a sua maneira de ser. Você se pergunta “Estou louco?”, “Sou estranho?”, sempre precisando de uma afirmação: o eco. Enquanto a resposta para essas duas perguntas ainda deva ser “Sim!”, é bom saber que você não é o único. Você não está sozinho...

E nós também. Durante a preparação desse álbum, meus amigos Geddy e Alex penduraram nas paredes do estúdio algumas “frases inspirativos" bem bobas, como essa:

Sozinhos, somos uns merdas; mas juntos, somos geniais.

Como a maioria dos lemas inspirativos, eles são hiperbólicos e tolos, mas expressam uma humilde verdade. Outra descoberta: fazemos nosso melhor trabalhando juntos. E temos os momentos mais divertidos juntos também. (Eis a parte “genial”).

Tínhamos levado um longo tempo sem sermos “geniais”. Depois da turnê Counterparts, finalizada em maio de 94, ficamos quase um ano e meio longe da banda e, durante esse tempo em que Geddy e sua esposa tiveram uma menina, Alex produziu um álbum solo e eu produzi um tributo ao grande Buddy Rich. Trabalhamos, viajamos, vivemos nossas vidas... e tudo foi muito bom.

Todas essas atividades nos mantiveram longe da agitação e longe das preocupações até outubro de 95, quando nos reunimos no Chalet Studio, um lugar bem calmo fora de Toronto. Da minha pequena sala em que compunha as letras, no final da casa, sempre observava os campos tingidos pelas folhas de outono nas proximidades do Lago Ontário. Com esse cenário agradável atrás do meu computador, comecei a enviar um monte de letras para o pequeno estúdio do outro lado da casa, onde Geddy e Alex pegavam pesado nos instrumentos e nos computadores. Quando passava as sessões de composições, os dois geralmente “construíam” as músicas, combinando versos e refrões, rascunhando os arranjos numa fita demo. A partir daí estávamos prontos para ouvir todas as músicas e para discutir quais delas estavam boas e quais poderiam ser melhoradas, tanto musicalmente quanto liricamente. Muitas vinham naquela forma implacável (guitarras, vocais e bateria) e, para mim, sendo o cara responsável pelas letras, ouvir pela primeira vez aquelas palavras em forma de música era como uma revelação. Inesperadas variações – e alguns defeitos – eram colocados numa sob uma afiada observação.

Mas desta vez escolhemos um outro método: enquanto as idéias musicais surgiam, eles ingressavam nas letras para tentar combinar um verso ou um refrão, gravando os fragmentos, para então fazer algo mais depois. Não quiseram se atolar no “quebra-cabeça” de montar músicas inteiras: eles preferiram manter o momento com o fluir de novas idéias. Muito bom, é claro, – seja qual for a maneira de trabalho – mas isso foi trazendo um pouco de ansiedade para mim quando semanas iam passando e eu ainda não havia ouvido absolutamente nada.

Entretanto, continuei “alimentando a máquina” com mais letras e, quando era preciso "descansar o lado esquerdo do cérebro", ia dar umas pancadas no meu pequeno kit no hall da sala. Durante nosso hiato, ao invés de começar a tocar direto, assumi uma nova postura em minha vida - após trinta anos tocando “da mesma maneira” (por “opção"), estava pronto para dar um passo adiante na performance, explorando de verdade a bateria. Foi maravilhoso. Dessa forma, os dias se passavam e eu ficava cada vez mais ansioso para ouvir algo novo. A parte esquerda do cérebro queria saber se algumas das palavras que havia escrito haviam sido trabalhadas. Quando troquei os hemisférios e fui praticar na bateria, o lado direito quis algumas canções para trabalhar. O dia já estava acabando quando Geddy e Alex estavam prontos para me mostrar uma música completa, e me chamaram lá no estúdio. Todos estavam um pouco nervosos, olhamos de relance uns para os outros e colocamos a fita.

Esqueci o nervosismo – adorei o que ouvi. Vestindo minha capa de letrista, foi gratificante ver aquelas palavras (que me traziam preocupação sem motivo) se tornarem canções e, vestindo minha capa de baterista, foi inspirador perceber tantas direções musicais para explorar e todas as possibilidades rítmicas. Foi muito bom.

Agora era hora de começarmos o processo de refinar os arranjos e desenvolver nossas partes individuais. E nesse momento começou a nevar – em proporções bíblicas! Uma nevasca nos golpeou no início de novembro. Redemoinhos árticos lançaram um intenso cobertor branco de neve em cima das árvores e dos pastos, e aquela seria a previsão do tempo até o término das gravações – que levaria seis meses. Nenhuma coincidência com o tema ártico mostrado na arte do disco, só combinou com nosso ambiente de trabalho.

No começo de dezembro as canções estavam quase todas escritas, arranjadas e gravadas (com todos os refinamentos possíveis). Nos juntamos com Peter Collins (ele e suas botas de neve). Nos anos anteriores, Peter tinha sido nosso co-produtor nos álbuns Power Windows, Hold Your Fire e Counterparts, e mais uma vez ele veio se doar para nós, sugerindo várias melhorias sutis, porém críticas, tanto nos arranjos como em nossas partes individuais. Talvez a maior contribuição de Peter foi o seu instinto em nos apontar direções que nunca havíamos imaginado. Esse é o motivo de se ter um co-produtor, é claro.

Enquanto o processo se desenvolvia, Peter manteve seus ouvidos direcionados para as canções e performances de forma "geral". Num certo momento, ele nos deixou para gravar com o engenheiro Clif Norrell (Faith No More, R.E.M., Catherine Wheel, etc.), preocupado com várias coisas – as porcas e parafusos da equalização, balanço e precisões matemáticas. A experiência de Clif e sua sensibilidade ajudaram a traduzir os sons que queríamos ouvir (nada de especial para ele!).

No início de Janeiro começamos a gravar no Bearsville Studios, em Catskill Mountains, no estado de Nova York e, naturalmente, lá chegamos em mais um dia da “Nevasca de 96”. De volta a Toronto, fomos ao pequeno e confortável mundo do Reaction Studio, e a neve continuou caindo (por quarenta e dias e quarenta noites). Em abril a primavera chegava, mas a neve continuava quando fomos para o McClear Place, prontos para a mixagem final. Pessoas diferentes têm reações diferentes nessa hora crucial. Para mim, que sou um cara impaciente que gosta de rápidas satisfações, esse momento se chama “O Final da Espera”. Já Geddy, ainda procurando, como sempre, uma súbita perfeição e miraculosa transformação, se refere à mixagem como “A Morte da Espera”. Para Alex, há coisas mais importantes: invenções, jantares e guitarras bem altas.

O engenheiro de mixagens Andy Wallace (Nirvana, Rage Against The Machine, Faith No More etc.), veio pro barco nesse momento tranqüilo (também com suas botas de neve), para acompanhar o processo de gravação. Trabalhando de forma rápida e intuitiva, Andy estava pronto para pegar todas as músicas que convivemos por tanto tempo para tecê-las em testes e padrões novos e inesperados. Quando ouvimos o mix das músicas pela primeira vez, invariavelmente dissemos algo como, “Uau – nunca pensei em gostar dessas músicas ainda mais!”.

E é por isso que precisamos de um engenheiro de som.

Essa é nossa historinha: Demos uma grande parada. Fizemos um disco. Está nevando bastante. Mais que uma simples histórinha, é uma “história antiga” cinemática, coisas que talvez possam ser lidas nessas linhas: todos esses anos que nos conduziram para onde estamos hoje, a ansiosa determinação que nos fez realizar esse projeto, o tempo e esforços dedicados em tudo isso (e não apenas durante a nevasca – são dois verões, tão certo quando dois invernos. Ou vinte anos. Ou trinta anos).

E há também, é claro, todas as músicas, e o que está “entre suas linhas”. Como na letra de “Test For Echo” (uma colaboração minha com Pye Dubois, assim como em “Tom Sawyer”, “Force Ten” e “Between Sun & Moon), que nos dá uma visão deste nosso mundo louco e nos oferece uma resposta implícita: "Com licença – alguém mais achou isso estranho?"

ALO-O-O-O-O! Test... pro... eco... Tem alguém aí?

“Virtuality” traz uma visão crônica similar a vida moderna – antes de tudo, o que é uma “canção virtual”? E quem quer curtí-la? O mesmo em “Resist”, com uma adaptação de citações de Oscar Wilde: "I can resist anything except temptation”. Bem, realmente, o que além de resistir?

Da maneira que tento resistir às tentações para falar da nossa própria música, pois temos a “modéstia do grupo” (embora um grande filósofo do baseball disse uma vez, “Se você realmente faz o que faz não é se gabar!”), provavelmente não deveria nem mesmo ter mencionado todos os solos de guitarra e performances vocais, e de como meus colegas brilham em canções como “Totem”, “Resist”, “Time And Motion” e “The Color Of Right” – droga, falei tudo sobre eles.

“Sozinhos, somos uns merdas...” Sim, isso é verdade, mas ainda agora – após tantos anos de aprendizado, acredito que finalmente chegamos em algum lugar. Juntos.

Sempre que começamos, e onde quer que cheguemos, espero de verdade que prestemos atenção na fase para encontrarmos o tipo de audiência que estará nos esperando. Se não, será como o comentário de Gertrude Stein em uma determinada cidade do centro-oeste: “Estivemos lá – mas não havia ninguém”.

Olá-á-á-á-á-á-á-á-á!


Teste... de... eco...


Tem alguém aí?

GEDDY LEE
Baixo, vocais, sintetizadores

ALEX LIFESON
Guitarra elétrica e acústica, mandola

NEIL PEART
Bateria, cymbals, hammer dulcimer

Brought to you by the letter R - r - r – r

Alex Lifeson

Aqueles tempos. É... me lembro deles. Éramos tão pobres que pensávamos que era um “legado” de geração pra geração! Meu velho pai conseguiu um terceiro trabalho de meio expediente limpando árvores de um parque, pois só assim ele teria recursos para comprar uma guitarra de $50 Conora para mim. Era feita no Japão quando isso significava – algo barato!! Não era como um sino ou um lindo assobio, não senhor. Era apenas inocente, sofrida, maçante – mas aquele era o estilo da época. É... eu me lembro daqueles dias.

Éramos tão pobres que não poderíamos nem pensar em ter um amplificador, por isso deixamos o assunto de lado sobre comprar um. Eu tinha que ir até a casa do vizinho, o Very Old Doc Cooper, que era mais velho do que os pais dele. Dizem que ele era louco por ameixas e morreu após comer um pé inteiro. De qualquer forma, ele me emprestava o amplificador de Paul, que tinha o mesmo som maçante, o estilo daquele tempo.

Meu velho pai começou mesmo a trabalhar no parque, e ele era eletricista! Ele tinha fita isolante entre suas coisas e, com essa fita, escreveu a palavra “VOX” ilegalmente na frente do amplificador. Amplificadores Vox eram para caras ricos como os Beatles, que era o grupo que eu queria me juntar porque ouvi de alguém que eles eram bons. Nunca consegui aquele emprego porque também ouvi que precisava ter o próprio equipamento para entrar no grupo. Eu tinha só treze anos.

Nunca havia tido nenhum outro tipo de equipamento. Naqueles dias, você tinha uma guitarra, um amplificador, e talvez um pick. E a gente mesmo sempre cuidava dos equipamentos, o que era normal. Isso porque, naqueles dias, “roadie” era quando um garotinho pegava seus equipamentos e ia tocar no meio da rua! Você realmente tinha que ser chamado assim, porque teve que andar para isso.

E nós éramos tão pobres que não tínhamos recursos para ter "bons amigos" que gostassem do nosso som, só porque eram nossos amigos. Ao invés disso, tínhamos amigos que falavam “Pare com esse som estúpido e alto, cara”!

"É? Você cala os seus amigos barulhentos e estúpidos”.

Eu lembro daqueles dias. E que dias.

Neil Peart

A bateria? Bem, é uma Stewarts, é claro, com um bumbo de 18" Capri que consegui na loja de um amigo, destacando as excelentes peças Ajax do Japão. (Como meu amigo Lerxst falou, naqueles tempo o que era "Feito no Japão" realmente não significava material de qualidade, com manufatura meticulosa, cara!).

Hoje em dia, embora minha bateria brilhe a cor vermelha mais uma vez (como se eu estivesse novamente “começando” a tocar), há um pouco mais do que a daquele tempo: elas são DW, feitas na América, com pedais, stands, e tudo mais (choque, horror!), além do snare. “O Velho Número”, com snare revestido de madeira que tenho usado desde então, foi retirado de cena depois de uma gloriosa carreira, e um par de snares DW foram colocados no lugar.

Os tons são 8", 10", 12", 13", 15" (dois), 16", e 18", o bumbo é um 22" (com um par de 18" "canhões" atrás do kit), misturado com dois 13" piccolo snares, samplers Akai dirigido por drum pads, Kat midi-marimba, pedais Shark e a seleção costumeria de cowbells e windchimes.

Os heads são Remo Embaixador revestidos de branco (apenas pra mudar), e os cymbals são da Zildjian, exceto um, que é Chinese Wuhan. Minhas baquetas são Promark 747 modelo "Assinatura", em madeira branca japonesa.

Meu professor tem sido Freddie Gruber, e gostaria de agradecê-lo por me guiar pelos caminhos da retidão.

Geddy Lee

O que fiz em minhas férias de verão (ou, "Um cara que estava indo fazer o que outra pessoa provavelmente faria!”). E aí? E aí? O que? Mas, primeiramente, deixe-me falar de como foram difíceis estes dias para encontrar sapatos como o que eu estou usando na foto, verdadeiras botas Beatle!

Em todo o caso, é hora de mais uma vez dar um passeio por alguns parágrafos. Deixe-me dizer um "bem-vindo ao show", e também, "obrigado”. Por que obrigado? Bem, é correto quando você leva alguns anos longe de turnês e gravações, e fica na dúvida se alguém ainda está interessado em você quando decide voltar! Então, por continuar tendo interesse e suporte dos fãs, gostaria de oferecer a vocês glórias, e um aperto de mão bem firme, e sinceramente dizer obrigado.

Yuccch!! Bastante calor! Agora, o que eu fiz em minhas férias de "verão" de dois anos? Oh... muitas coisas domésticas que realmente só interessam a pessoas que estão vivendo um modelo de vida doméstico. A cena é conhecida: tenha filhos, assista "Pingu", aprenda como alimentar a família sem encomendar comida, jogue Fantasy League Baseball, construa uma casa e, é claro, ter a experiência obrigatória com a barba. Coisas que, eu suponho, não são muito "copiadas”. Mas, você sabe, um cara começou a fazer e... blá, blá!

Logo após a calmaria cedo ou tarde vem a tempestade. E nem um minuto atrasada! Sem dúvida, já - eu confesso, estava pronto para escrever e pronto para voltar. Então lá vamos nós!!


Paz, Geddy


OBS: Para quem isso possa interessar, aqui está minha lista de equipamentos para a turnê Test For Echo; Baixos: Fender Jazz. Amplificadores: Trace Elliot Quadra 4 amplificadores, pré-amplificadores Trace Elliot Gp-12, Trace Elliot 1 x 18" and 4 x 10" speaker cabinets, simulador speaker Palmer PDI-03, SansAmp modelo PSA-1. Teclados: muitos! Efeitos: Milk Shake Commodore Deluxe Trio, batedeira Osterizer Deluxe 2 velocidades, espremedor Proctor-Silex Deluxe Oscillating Strainer, geladeira Frigidaire Deluxe, moedor de carne Beatrice Deluxe #2 Manual, torradeira automática Morphy-Richards Deluxe.